quinta-feira, 31 de março de 2011

A amante

No início era apenas a raiva e a disputa que as cercavam. Uma espécie de duelo à moda antiga. Algo como no Velho Oeste: pegue sua arma e atire primeiro quem puder!

Ambas atiraram e se feriram. Adiantou? - uma se perguntava ao sentir a dor do ferimento exposto. Não, nada àquela hora adiantaria.

Mas o tempo passou, passou como sempre passa em qualquer outra situação. E com ele passam todas as outras coisas, os motivos, as mágoas e as sensações desagradáveis. Pois bem, passaram. E, então, puderam se olhar francamente.

E quando se olharam descobriram o pior, ou talvez melhor: a semelhança. O sorriso, a inocência, a idade, as dúvidas, as incertezas, as inseguranças, as melancolias, as leituras, as manias, os vícios, as dificuldades, e claro, o amor. Era óbvio que o amor pela mesma pessoa era o que havia feito seus caminhos se cruzarem noutro momento, mas agora era diferente. Era um espelho enorme que se equilibrava na linha do tempo. E, embora houvessem sentido algum estranhamento, se descobriram gêmeas da mesma inútil busca inexistente da perfeição inalcançável.

E, se entre os dentes cerrados flutuaram palavras arrastadas, hoje as bocas só servem para dizer a mesma coisa num uníssono: "eu senti o mesmo".
É aí que todas as mulheres se misturam, compreendendo espíritos de mãe, esposa, amiga e amante. E com isso nascem novos sentimentos, compaixão e carinho.

Suspeito que seja de uma relação assim que surgiu o primeiro clã feminino, que certamente precedeu "A queima de sutiãs". Bravo!!!

sexta-feira, 25 de março de 2011

Vida em três tempos

Ela nasceu pequenina, uma boneca de pano, molenga, branquela, mas com vida. Em vez de chorar olhou fixamente os olhos do médico e de sua mãe. Começava ali, naquele frio hospital, a sua trajetória.
Quando aprendeu a equilibrar-se sobre suas duas pernas roliças se sentiu poderosa e dona de um dom sobrenatural. Era a gigante que esmagava as formigas, que corria atrás dos bichos e que podia fugir e chegar a qualquer lugar, mesmo o mais distante.
Aos seis anos dominou os lápis de cor e fazia pinturas majestosas dignas de uma verdadeira pintora. Criava desenhos extravagantes que iam além dos limites traçados pelo dever de casa dado pela professora primária.


A adolescência foi banhada por muita revolta e cores escuras. Bandas, tênis e roupas esquisitas. O disc man era o auge, as pilhas eram uma fortuna e as fantasias eram muitas. Época de grandes descobertas e façanhas.


A vida adulta enfim chegara. O dia esperado! A alforria. Ah! quanta vibração dentro do seu próprio coração. O som da maioridade parecia vir de uma potente caixa amplificadora.
Que maravilha! Era responsável por ela mesma. Por ela e pelas contas de luz, água, telefone, celular, aluguel, vestidos, sapatos, comida, baladas, viagens, gasolina, maquiagem, perfumes, jóias, bijuterias, Avon, Natura, Racco, Jequiti, Di Larouffe e o escambau à quatro que essas revendedoras adoram!

Ufa! Como é que faz para apagar o último parágrafo??

terça-feira, 1 de março de 2011

O Rio e O Balde.

Era um rio. Um rio manso que corria. E corria e nutria. Era um rio. Um rio cujas águas nunca eram as mesmas, e as águas que por ali passaram jamais tornariam a passar. Pois era um rio. Rio que enveredava pelas terras e fugia de toda prisão. Rio que não se prende, rio que corre. Corre e desatina. Mas o rio lava, o rio dá vida.


O balde é apenas um balde. Balde antigo de madeira feito apenas para segurar água. O balde prende a água. E o balde vai levar água do rio às pessoas.
Pobre balde, acredita que poderá ter o rio. Mas o balde só consegue uma parte de sua água. Que balde poderia comportar tamanha grandeza que é o rio?

O rio ri do balde, enquanto suas águas correm pra imensidão do sem-fim. Mas e o balde?

O rio esteve no balde, e o balde teve seu rio.








ps: Texto um tanto quanto despretencioso e bobo, talvez até redundante. Mas quem poderá contestar a história de um balde e seu rio?